sábado, dezembro 29, 2007

a saia das preguinhas...





Às vezes apetecem-me os passeios sem estrada nem trilho e, simplesmente, vou caminhando...

Hoje, fui até uma saia de preguinhas, de um xadrezinho em tons de azul, que recordo num colo seguro e risonho que já partiu... Nessa saia das preguinhas, eu lembro como era bom correr ao longo do caminho que me levava a casa da ti Encarnação do Torcato, que me sorria por entre a falta tão grande de dentes e me dizia, plena de ternura, como quem ralha a brincar: "Lá vem o diabrete das coxinhas gorduchas... Olha que tu num t'alembres de me soltar os patos, mafarrica! "E eu lá lutava contra o desejo de a ver naquela correria extraordinariamente manca atrás dos bichinhos... e acabava por não os soltar... Depois era o aroma do leite acabadinho de tirar e o ti Torcato, sempre apoiado no seu velho cajado, e a coçar os poucos cabelos que lhe restavam, na velha azáfama de ir levar o leite ao posto: "Queres vir comigo cachopa? Levo-te em cima da vaca... " Fascinava-me a ideia de ir em cima da Formosa, mas a avó podia ralhar... E nunca fui!

Noutros dias a minha saia de preguinhas levava-me com a Ana em busca de musgo fresquinho e bem verde para enfeitar o presépio que ia encher completamente o vão das escadas e subir em estrelas e luzes ao longo do pinheiro que o Sr. António todos os anos ia cortar ao pinhal, para dar de presente ao Avô Pinto...
E o que eu sonhava junto daquele presépio a transbordar de imagens que ganhavam vida logo que banhadas pelas luzes de tantas cores... Durante semanas aquele era o lugar mais bonito do mundo e as minhas brincadeiras e sonhos passavam a ter uma paisagem cheias de trilhos por onde os meus deditos passeavam transformando-se em pastores, moinhos, ovelhas, reis ou anjos... apanhava as flores mais pequeninas que encontrava no jardim para tornar aquele paraíso mais real, e dava até uma casa aos bichinhos-de-conta do quintal que tinham, concerteza, no Natal, um espaço cheio de amor e carinho para se enrolarem confortavelmente nos seus medos... às vezes eram caracóis e até sardões, porque as crianças ainda não cresceram o suficiente para terem nojo ou medo dos animais do jardim...
O pior é que a avó já era crescida e quando dava conta da bicharada fazia do chinelo uma rebarbadora e punha abaixo o bairro de lata do meu presépio...
Eu... ficava de castigo e a minha saia de preguinhas enxugava-me as lágrimas...

Depois, mais tarde, chegava o meu colo imenso que me aconchegava ao peito, enquanto endireitava a minha saia de preguinhas e me dizia: "Porque é que a minha menina faz tantas asneiras?"
Não eram... mas ele não sabia! Afinal também já tinha crescido...


Cris (Do Jardim da Minha Alma)

sábado, dezembro 22, 2007

Nesta manhã em que quero o Natal!...





Acorda comigo nesta manhã em que quero o Natal
Ajuda-me a espreguiçar e a sentir os primeiros raios de sol
Sorri para mim no mesmo sorriso que te dou e que é igual
A todos os sorrisos que tomam o olhar por farol
E se misturam nas ternuras e carícias do amanhecer...

Vamos estender os nossos corpos para além da cama
Pisar o chão macio num contorno do que está para além de nós.
Podemos ser as luzes cintilantes da árvore, símbolo de quem ama
E darmo-nos os presentes divinos que ecoam para além da voz
E nos fazem, de vida e de amor, estremecer...

Abandona-te comigo num abraço para além do espaço e do tempo
Um abraço para esquecer murmúrios e lamentos
Daqueles em que os braços são só pele e mãos e desejo
E o coração num instante abarque o mundo
Para nos darmos de presente o presente mais profundo:
Um acordar pleno de nós... cobertos de beijos!

Cris (Transparências)